sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

tertúlia farense

Ontem foi noite de Tertúlia Farense. Foi a 11.ª sessão, foi a minha 9.ª participação e quanto a mim foi uma das melhores sessões.

Nas nossas conversas sempre informais abordam-se os “temas farenses”. Tendo como ponto de partida Faro, fala-se sobre a cidade nas suas múltiplas dimensões, múltiplas perspectivas e com oradores de várias áreas de saber – o que enriquece a tertúlia. Sempre em bons restaurantes da cidade (ou arredores! Já fomos a Estoi, por exemplo) onde nos é apresentado o melhor da gastronomia algarvia.

Desde que fui convidada a participar nestas sessões (porque só se vai por convite.. não que seja alguma espécie de sociedade secreta mas é assim que funciona) só faltei uma vez. Aprendo imenso em cada uma, não só porque fico a conhecer melhor a cidade, a sua gastronomia, a sua história, a sua evolução, a sua constituição, etc., mas também porque acabo por conhecer melhor o Algarve.

A ementa de ontem era composta, entre outros petiscos, por Xarém (um prato de papas de milho – ontem com conquilhas, chouriço e toucinho - que só descobri há coisa de um ano... O que eu andei a perder!!) e Caldeirada à Algarvia com tamboril, safio, raia (e possivelmente outros que não terei identificado...). Após o saboroso jantar, o orador convidado tomou a palavra: Eduardo Brazão Gonçalves falou-nos de “Faro em meados do séc. XX”.

E que delícia que foi ouvi-lo! Este algarvio de Boliqueime, veio aos 8 anos para Faro, entretanto passou por Lisboa mas nunca perdeu a ligação à cidade farense e é onde reside actualmente. É autor de alguns livros, entre eles o “Dicionário do Falar Algarvio” (que tanto jeito me deve/ deveria fazer!) e o “Faro, Figuras e Factos em meados do séc. XX” – e foi sobre estas “personalidades notáveis, figuras «notórias», acontecimentos diversos e lendas várias”, sobre as personagens típicas de que geralmente a História não fala mas também elas património que ontem nos deu conta.

Da mesma forma que em Lisboa temos as conhecidas figuras dos bairros típicos, das quais também nos falou (por exemplo a Ana da Touca, a Cochicha, o Zé do Risco, a Maria dos Espartilhos, a Preta Fernanda – segundo consta uma cabo-verdiana que tinha um mapa da cidade onde tinha assinalados os seus amantes! –, a Rosa Maria da Rua do Capelão, o Manuel dos Assobios, o Zé Nabo, o Perna de Pau, entre tantos outros!), Faro também tem as suas e acabaram por inspirar EBG.

Além de ter aprendido certas expressões e palavras novas, encontrei a explicação para os episódios mais estranhos que vivi por cá. Sempre pensei que fosse uma espécie de íman para as pessoas/ situações esquisitas mas ontem confirmei que o “problema” não é só meu! Ontem reconheceram que em Faro se concentravam “muitos deficientes mentais e aleijados” (a expressão não é minha, foi usada por alguns farenses!), fruto da ausência de cuidados de saúde no princípio do séc. XX na serra e barrocal algarvios e que se concentram na baixa...

Como dificilmente sobreviveriam no campo, vinham para a cidade, acabando por andar à sorte. É que ser pobre no campo era diferente de ser um pobre na cidade, já que no campo havia sempre um vizinho que podia socorrer, ou uma figueira carregada de figos à qual “se podia jogar a mão” (o “jogar” também é típico) sem ninguém levar a mal.

Um facto curioso, e que eu desconhecia, é que chegou a estar regulamentado oficialmente quando é que os pedintes poderiam andar de porta em porta – o “Regulamento do Pedinte de Rua” definia que só era possível fazê-lo na cidade ao sábado de manhã!

A dada altura foram mencionadas algumas das personagens de Faro que eram muito engraçadas!! Desde o Tó-Quim, o Acarreta Pãezinhos, a Maria das Alcagoitas, o Engraxador, a Judia da Alagoa (quando falaram da personagem alguns rostos tinham uma expressão do tipo... “casa da luz vermelha”! Ahahah), o Manuel Mata Gatos, o Antoninho Picha Linda (este era maricas), entre tantos outros. Até havia um cão famoso, era o Merdock! Deu uma trinca ao reitor do liceu da altura e teve direito a uma “visita” ao canil municipal – sim, visita! Porque a revolta das pessoas foi tanta que o cão acabou por não ficar no canil e assim escapar a um triste fim. E a história do cão é tão curiosa que até tem uma lápide no liceu!

Para além das personagens e alguns dos episódios protagonizados, também foram referidos lugares da cidade como a Rua do Peixe Frito, a Avenida das Palmeiras, do antigo Mercado, a Rua de Portugal (a única existente no país), dos jogos que se faziam na altura (jogar ao belindre, os cromos, etc).

A noite foi de facto muito animada! Adorei ouvir aqueles episódios da história de Faro. Quando interrompiam o senhor, quase sempre os mesmos, ele protestava com um “ai.. estes Hugo Chavez...”!

Ouvi novamente falar em montanheiros (=saloios), nos griséus (=ervilhas), nas alcagoitas (=amendoins), em estar marafado (=aborrecido/ irritado), estar almariado (=enjoado), entre outras e aprendi novas palavras/ expressões como aí é Marrocos (que era depreciativo), mais junto que a areia (=muito/ muita quantidade), punhada (=pancada), e outras mais.

Entre tudo o que se disse, considero que as frases tipicamente farenses são “Alguma vez?!”, “Toma lá tu, desgraçado..”, “Ma que jêtos?” ou “Tal é essa?” e o cumprimento “Mó, então? Assim é que é?” – isto é lindo!

A tertúlia encerrou com uma “versalhada” pelo senhor Franklin. Fez uns versos sobre o Zézinho Beirão, outra figurinha farense vendedor de peixe (que costumava ter por companhia tantos gatos que acabava por não vender nada!), um “filho da rua, dono do sol e da lua” que acabou por se suicidar... depois de privado de liberdade ao ser internado num “albergue”.

Para o ano há mais! O grupo de convidados da Tertúlia Farense vai de férias e a próxima sessão já será em 2008. Vamos ver onde estarei nessa altura...













Vista de Faro... que não é minha e também não sei de quem é... ops!

2 comentários:

(n)Ana disse...

Isso das Tertúlias é bem giro pah!

Zoe disse...

É mesmo muito bom e nunca pensei gostar tanto :)
Tu também devias gostar!